quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Compasso Final


Eis que ela aproxima-se bela e envolvente em seu vestido negro noite.  Sua coreografia é hipnotizante e triste, mas seus olhos são vibrantes. Sonhara com ela por anos, desejara-a - quiçá desde que havia nascido- mas sempre estivemos distantes. Hoje, porém, acordara com seu perfume floral e com seu musical réquiem.
Era indefinível o que sentia. Que sabor teria seu beijo vermelho? Sabia apenas que acompanhá-la era entrar em uma viagem misteriosa e solitária, repleta de chuva e adeus.
Ela, a quem tentara entregar meus dias tantas vezes. Ela a detentora da ponte, do silêncio e quiçá de mim. Sua presença gélida amedrontava e seduzia-me. Não entendia seu aparecer repentino numa manhã de verão. Sem prévio aviso, no momento mesmo em que me casara com a felicidade e a esquecera quase por completo, ali estava ela estendendo-me a mão.
Olhei pela janela, pássaros cantavam livres, céu azul, sorrisos soltos ao vento. Meu coração assim também se encontrava. Ao meu lado a imagem da paz em olhos de mel, o amor em forma de mulher que não percebia o que acontecia e placidamente dormia o sono dos inocentes. A hora chegara e era inegável que esse era um bom dia para dançar.
Com as mãos e lábios repletos de saudade despedi-me de meu amor, sentei-me na cama e aguardei que ela me envolvesse em seus braços.Era leve seu toque, sério e objetivo seu olhar, mas como era doce seu bailar!

Aconcheguei-me no azul e entre nuvens brancas e profundo silêncio iniciamos a viagem.