“ O mal do século é a solidão, cada um de nós imerso em sua
própria arrogância esperando por um pouco de afeição”. Renato Russo
Ele era belo.
Determinado, tal como criança ansiosa, buscava o que queria
sem muitos cálculos, sem muito pudor. Era o dono, o comandante.
Ele era belo. E sua
beleza e juventude, seu ar de sabe-tudo, seu poder de persuasão, sua mão forte
e voluntariosa em busca do que desejava escondia suas angústias.
Ele era belo, carismático e sozinho.
Solidão que escondia no fundo dos olhos, lá onde
desaprendemos a olhar, lá onde ele entedia que estava seguro seu segredo, lá onde
ele sabia que ninguém ia observar.
Ele era belo. E o mundo acreditou que a vida lhe seria leve
e doce, mas ele não queria o sol, nem a chuva, nem o branco nem o preto. Não
queria passos predeterminados. Preferia o arco-íris. Quis traçar o seu caminho, pensou que era
forte, como a mão que usava para agarrar o que julgava seu.
Mas o caminho pelo ou para o arco-íris, esse caminho da contramão,
é ferro, é fogo, é escuridão. É dor
perene que precisa ser curada diariamente. É uma luta árdua, que nos traz as flores e
seus perfumes, mas que não nos poupa os espinhos.
Ele era belo. E sua beleza foi cântico e balada, foi poeira,
foi bola de sabão... passou colorindo e encantando, mas deixando cada vez mais
deserto seu coração.
Ah, o coração. Quantas vezes ignoramos seus apelos?
O tempo, escultor incansável do que somos, deixou nele
cicatrizes profundas. E o fundo de seus olhos guardava cada vez mais segredos,
e sua cabeça cada vez mais tempestades e seu corpo cada vez mais dor.
Estava no arco-íris. Determinado como era, não desistiria de
ali viver, mas com tanto peso guardado... com tantos espinhos encravados... não,
ele não era tão forte quanto pensara.
O poeta estava errado, o mundo pesa muito mais que as mãos
de uma criança. E por vezes somos a criança que precisa de colo, que quer
dividir o peso, que só precisa chorar.
Ele agora decidira seduzir sua própria solidão. Ia casar-se
com ela, dançar pela eternidade.
Ele era belo e determinado.
Um Chandon, uma foto, uma comemoração.
Naquela noite
livrar-se-ia de todo peso. Era a noite das núpcias. Um casamento sem
convidados, sem música, banhado apenas pelo vermelho. O derradeiro ato das
fortes mãos e o mais determinado de todos eles.
Seria a mais bela das dores, a da liberdade.
Voara em céu e terra rubros.
Ele era belo. E agora em seus olhos não havia mais
nada.
O dia amanhecera vazio, quente de sufocar.