terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Noite sem palavras

Palavras...seres capazes de destruir sonhos ou de fazê-los nascer, palavras...a força da sua presença tão vulcânica e mortal quanto sua ausência. Palavras...universo oculto e gigantesco, tal como as profundezas marinhas fascina, amedronta, move. Palavras?
Domingo, brisa do mar, lua cheia, amigos, conversas, sorrisos, todos os elementos para horas agradáveis, suaves. Porta aberta, olhos displicentes, nossa atenção voltava-se às tramas e aos dramas de nosso cotidiano. Fim de semana despedindo-se e nós a beijar-lhes as derradeiras gotas. Parece simples, comum- mas os deuses gostam de surpreender.  Do negror noturno surge um homem, olhos tristes e enleados, blusa azul. Mira-nos, pede um cigarro, acende-o, vai-se.
Palavras soltas ao vento voltam a bailar na varanda, segue breve nosso pulsar. Segundos, minutos? Difícil dimensionar o tempo, mas ele passa. E ele, o homem, de olhos ligeiros e melancólicos, aquele cinza desconhecido retorna das trevas da noite em sua blusa azul. Para, pede atenção, comenta o erro da estrada - entrara na rua errada, a da minha casa não tinha saída - e aproveita a lacuna de nosso silencio para comentar outro erro, o da sua própria estrada, ela também não tinha saída.  Jogou-nos de supetão sua dor (era usuário de craque “apesar de pertencer a uma boa família” e estava em depressão “ de morte”), suas palavras secas e sangrantes cortaram nosso domingo feliz  como navalha tão afiada que picotou todas as nossas palavras- que teimavam em saltar na mente, mas morrer antes de chegar  aos lábios.
Aquele homem deu-nos seu pesar, mas de forma tão inocente quanto uma criança que se queixa de sono. Apagou-nos o luar, sorriu desconcertado, desejou-nos as mais belas flores- “Fiquem com Deus e em paz”, aproximou novamente o luar da varanda e foi tragado pela noite sem dar-nos tempo de devolver-lhe, ao menos o brilho ao olhar.
O que o fez parar? O que desejava ao proferir tais coisas? Esperava em troca palavras azuis como sua camisa? Estaria pronto para o silencio? O que o levou embora?
Foi-se e deixou aqui esse mundo de léxicos afogados, que não foram ditos e que ele talvez precisasse. Foi-se, deixou a perturbação do silencio e a luz do luar. Foi-se e deixou-me aqui com esse sabor de palavras mortas e esse vazio do não dizer.

2 comentários:

layse disse...

fiquei arrepiada:)
sem palavras!

layse disse...

Belo texto!!
como sempre você arrasando com esses textos:)
rsrsrssr