sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Sal, Pimenta e Colorau


Você acorda cedo, toma seu café, despede-se de sua esposa e vai para o trabalho. Executa suas tarefas diárias, estressa-se, almoça, estressa-se novamente, volta para casa, janta, assiste ao jornal, conversa coisas das quais não vai se lembrar, toma um belo banho e dorme. Quando amanhece volta para mesma dança diária, sem câmera, sem luz, apenas com a ação instintiva do sempre.
A corrupção? A violência? Os sonhos e crenças? Tudo dissolvido nessa passeata do imediato, do “necessário”. Você sorri, vai ao cinema, namora e discute o futebol, ou mesmo a novela que tem tomado a atenção geral com seus conflitos psicológicos e morais. Mas que sabor esses momentos deixam na sua boca? Amanhã quando parar para lembrar a gracinha contada pelo amigo, que cor terá a cena? Ele disse mesmo alguma gracinha? E os perfumes? Que cheiros invadiam o espetáculo da sua vida enquanto você a via passar?
Na adolescência temos tempo e curiosidade. Habita em nós, ainda, a poesia, e captamos cada sensação, ativamos todos os sentidos, respiramos com os poros. Lembra a sua primeira namorada? Que cores havia na cena? A primeira vez que saíram juntos, que notas possuíam seu perfume- adocicadas, amadeiradas, florais? A cena certamente tem uma cor, é colorida com a empolgação daquele momento. E seu primeiro salário, o resultado- positivo ou negativo- do vestibular? Tudo com os devidos sabores e cheiros, certamente você os carrega agora na boca. A vida nesse tempo era temperada e você nem sabia. Igualmente à comida quentinha que sua mãe preparava. Uma delícia, mas quem parava para pensar nisso?
Um dia desses na sala de aula perguntaram sobre o que era essencial. Uma questão para qual o professor não esperava respostas de filosofia profunda, queria apenas reflexões sobre as atitudes que devem ser tomadas no ambiente de trabalho. E era o que íamos dar a ele, até que uma patricinha infame resolveu quebrar a santa paz do nosso cotidiano.
- Colorau!
-O quê?
- Essencial mesmo é colorau. Quem consegue comer um alimento sem cor?
Colorau??? Patricinha fútil! Condenada até em décima instância e ignorada em todas as suas baboseiras. Que relação havia entre o que ela estava falando o que perguntava o professor? Piada! Mas a sonoridade daquela palavra continuava na minha mente, não consegui nem ri, nem ignorar, para mim era pura poesia. Será que ela não tinha mesmo razão?
Ontem, após algum tempo de ausência, fiz uma reunião em casa, estavam presentes alguns queridos amigos, meu irmão e meu amor.  Que cor tinha a cena? Vermelho, vermelho de sol radiante, presente nos sorrisos, nos abraços, e até nas gracinhas. E o sabor? Era de massa, vinho e saudade vencida. E o perfume? Mistura de amadeirados e florais, na verdade era um cheiro de pimenta usada no ponto exato - esquenta, mas não corrompe.  
Ontem, vivi cada momento tal como na adolescência, aberta a todas as sensações e descobri que era poesia- e não futilidade- o que dizia a minha colega. Não quero mais aquela rotina sem sons, incolor, insípida e inodora. Já bebo água o bastante, não quero viver água!   Ela estava certa, embora incompleta.  Essencial, mesmo, é: sal, pimenta e colorau.

3 comentários:

layse disse...

Sempre arrasando com esses textos!!
Adorei:)

Edyruiva disse...

Muiitoo massa.. Lindooo mesmo, mais lindo é quando vemos(cor) e sentimos(sabor) as sensações(pimenta) dos momentos vividos....

Edyruiva disse...

*Cor(coloral), sabor(sal) e pementa(sensações)....